Este artigo foi publicado no Jornal Gazeta do Povo (Curitiba) no dia 5/12/2010 [1].
Certa vez, um pai de classe média
alta de um bairro nobre do Rio de Janeiro teve uma tentação que pode ocorrer a qualquer
um de nós: descobrir se o seu filho único adolescente o amava mais do que amava
a mãe. Um dia, chegando mais cedo em casa após o trabalho, cedeu à insídia
diabólica, motivado possivelmente pelo recente presente de aniversário que dera
ao filho, um videogame de última geração, não muito barato.
Sentou-se na sala de estar junto com ele, compartilhou um refrigerante, e de repente lançou-lhe a seguinte pergunta: “E então, filho, tire-me uma curiosidade: Você gosta mais da mamãe ou do papai?”. O filho, olhando-o profundamente nos olhos e respirando fundo, talvez buscando forças dentro de si para ser sincero, disse-lhe: “Quer saber mesmo, papai? Pois de quem gosto mais mesmo é do Jorge, o jardineiro do playground do prédio. Ele é quem fala comigo todos os dias, me ensina a plantar flores, me pergunta como estou indo na escola, torce comigo quando assisto na TV ao Flamengo jogar...”.
Sentou-se na sala de estar junto com ele, compartilhou um refrigerante, e de repente lançou-lhe a seguinte pergunta: “E então, filho, tire-me uma curiosidade: Você gosta mais da mamãe ou do papai?”. O filho, olhando-o profundamente nos olhos e respirando fundo, talvez buscando forças dentro de si para ser sincero, disse-lhe: “Quer saber mesmo, papai? Pois de quem gosto mais mesmo é do Jorge, o jardineiro do playground do prédio. Ele é quem fala comigo todos os dias, me ensina a plantar flores, me pergunta como estou indo na escola, torce comigo quando assisto na TV ao Flamengo jogar...”.
Infelizmente,
este caso decepcionante poderia repetir-se cada vez mais nas famílias e nas
escolas. Pais e professores, talvez por não terem sido bem formados nos verdadeiros valores humanos, passam
a acreditar que amar o filho ou o aluno é simplesmente enchê-lo de alegrias
materiais e afetivas e poupá-lo de exigências e sacrifícios. Assim, acabam
ficando um pouco inseguros e perplexos na hora de escolher o caminho a seguir
para ensinar o pupilo a amar, e acabam cedendo no mais fácil e imediato.
Antigamente, a tradição cultural que se respirava nas famílias e no ambiente
escolar ainda sustentava esses pais e professores no ensino do verdadeiro amor,
mas hoje, com a perda total de referências éticas, aliada à ausência de bons
modelos na sociedade, parece que se torna cada vez mais urgente que os
educadores (re)aprendam o verdadeiro conceito de amar.
Amar é, segundo Aristóteles, querer o bem do outro pelo outro. E que quer
dizer querer o bem do próprio filho ou aluno? Quer dizer que os pais e
professores devem estar motivados a se sacrificar para torná-lo realmente feliz ensinando-o a amar, sem
querer nada em troca para si. Infelizmente, isto pode parecer fácil na teoria,
mas na prática, temos a experiência que nem sempre é o que escolhemos. Além do
mais, o egoísmo humano é traidor e consegue por vezes instrumentalizar os
próprios filhos e alunos para preencher carências afetivas, usá-los para
demonstrações da própria inteligência ou poder, ou ainda transformá-los em espelhos
do próprio umbigo, querendo, portanto, o seu
próprio bem e não o bem do jovem. Ensinamos a ser egoístas.
É fácil deduzir então que o grande
pré-requisito do bom educador é uma grande dose de desprendimento em toda a
tarefa educativa. Somente assim o educando poderá aprender esta linguagem do
amor contemplada no próprio exemplo dos pais e professores, seja em casa, seja
dentro da escola. Quando a criança percebe que os seus educadores se esforçam em
tantas pequenas renúncias diárias e que buscam ativamente demonstrações de
carinho e de respeito mútuo em seus relacionamentos, sua natureza ficará não só
inclinada a imitá-los, mas sentir-se-á feliz quando conseguir vivenciar esse
amor prático.
Os
educadores devem ter consciência de que o “Frei
exemplo é sempre o melhor pregador”. Quando a criança aprende antes as lições
que também são vivenciadas pelos pais e professores, ela aceitará depois com maior
facilidade toda a ação educativa, que na prática é quase sempre ensinar a amar
os outros, por meio do caminho árduo das virtudes éticas. Aceitará, por
exemplo, as correções, as exigências escolares, os castigos, as broncas,
enxergando-os como formas corretivas para amar mais os pais, professores, e os
próprios colegas de classe. Podemos intuir, portanto, que o melhor que os
educadores podem dar aos filhos e alunos, mais que grandes manifestações de
afeto superficial e efêmero, será sempre o próprio exemplo de doação mútua, pois
desta forma os jovens se enriquecerão e não se deixarão seduzir pelas formas
falsas de amar que tanto se divulgam na cultura dos dias atuais, como o prazer
fácil do sexo ou das amizades superficais das comunidades virtuais ou
ocasionais.
Mas
uma questão fica no ar: como nós educadores adquirimos a força do amor, principalmente
quando faltam as energias e isso se torna doloroso e humilhante? A tradição
cultural de que falávamos apontava para a necessidade de, nestes casos de
dificuldade, recorrer à oração. De alguma forma, ela nos dizia que ensinar a
amar exigia ensinar ao mesmo tempo a rezar. Parece que este costume diminuiu
sensivelmente nas famílias e nas escolas. Por isso, sou da opinião de que uma
das formas mais pedagógicas de ensinar os jovens a amar é que nós educadores
ensinemos também com o exemplo a olhar para o Céu. As crianças aos poucos irão
compreendendo que este é o verdadeiro fundamento da nossa esperança e do nosso
otimismo. Que, no fundo, no fundo, é esse o verdadeiro Bem que é preciso querer
para todos...
Concluamos,
portanto, que se o ideal de felicidade que todos almejamos é formar uma família
feliz, uma família que “deu certo”, é preciso (re)aprender a linguagem do amor,
que nasce da contemplação transcendente e das pequenas vitórias diárias no
relacionamento. Quando isto é vivenciado também nas escolas, então nossos
filhos estarão preparados para enfrentar as dificuldades da vida, porque descobrirão,
por meio dos pais e professores, que o caminho para se conseguir a felicidade
não estará numa vida cômoda, como se pensa hoje, mas num coração enamorado.