Este artigo foi publicado no Jornal Gazeta do Povo (Curitiba) no dia 27/02/2011 [1]
Parece que não passa mais pela
cabeça de nenhum educador ser contra os computadores no processo educacional.
As possibilidades dos recursos disponíveis como instrumento de comunicação e de
informação são tão grandes que qualquer pessoa de visão perceberá a necessidade
de investir pesado nas tecnologias informáticas. Por outro lado, é importante
não ser ingênuo, e também ser capaz de enxergar, por trás desta nova onda
educacional, muita ideologia, diversos interesses políticos e financeiros e,
principalmente, uma grande ilusão de que o avanço tecnológico irá resolver os
principais problemas de aprendizagem.
Com
efeito, muitos governantes acreditam que estes novos recursos didáticos irão
nivelar as diferenças sociais, ajudar na educação dos mais desfavorecidos, preparar
jovens para uma atividade profissional promissora e, a longo prazo, inclusive ajudar
a poupar dinheiro na escola, dispensando uma parte dos professores,
considerados “desnecessários”.
Outras
vezes são os informes oficiais ou os artigos sobre a tecnologia da informação na
educação que estão cheios de clichês sobre a “relevância” e a “modernidade” das
novas máquinas na sala de aula, ou sobre sua importância para alcançar a verdadeira “autonomia” dos alunos.
Entretanto, não costumam referir-se às consequências de longo prazo causadas
por estes recursos na vida dos alunos, e muito menos aos resultados para o desenvolvimento do pensamento da
criança. Com frequência destacam o
prazer que a criança manifesta ao utilizar estas tecnologias nas tarefas
escolares, mas não se preocupam em comparar os ganhos reais que se obtém em
determinada disciplina adotando ou não tais ferramentas. Destes referidos
documentos, costumam constar também preocupações com os docentes, indicando que
devem aprender a utilizar melhor os recursos informáticos. Porém, raramente
aconselham uma atualização ou aprofundamento na matéria específica que devem
transmitir aos alunos. O método é visto como mais importante que o conteúdo.
Por
fim, são muitos vezes alguns filósofos e psicólogos da educação os que possuem uma
visão um tanto distorcida da realidade dos alunos ao acreditar que o computador
irá desenvolver o gênio criador que estaria latente em toda a criança, e que, ao
ser libertada dos estudos sistemáticos, ela poderia por conta própria aprender
com muito mais motivação e proveito... Será real isto?
Erling
Dale, um pesquisador sueco nesta matéria, critica o método que assume ser mais
produtivo dar rédea solta aos impulsos criadores dos alunos, do primário ao
secundário, deixando-lhes liberdade para desenhar, pintar, etc. Segundo Dale,
tal modelo é falso, pois quando a criança realiza algum trabalho nestas
condições, ela não produziu qualquer obra de arte, mas simplesmente provas de uma motricidade não desenvolvida. Caso não
seja ajudada a desenvolvê-la aprendendo novas formas de expressão, passará a pintar
na única forma que sua limitada capacidade conceberá, estancando seus dotes
artísticos com apenas sete anos. E o pesquisador conclui: a pedagogia que se
baseia na livre expressão da personalidade do menino provavelmente deixará
muitos jovens “desenhando como quem tem sete anos”, mas em todas as matérias escolares!
Alinhando-me
ao estudioso sueco, sou da opinião de que a pedagogia centrada no aluno, dando-lhe
uma liberdade praticamente absoluta para trabalhar e pesquisar com o
computador, se apoia numa representação negativa da aprendizagem e do
conhecimento. O mito – transmitido desde Rousseau – que dita que o menino nasce
criador é uma ilusão. Nenhuma criação se dá sem um treino. Toda a formação
estética implica num trabalho anterior com modelos, técnicas e repetição. O
conhecimento em geral somente se adquire com trabalho duro e esforço
perseverante. Se estudarmos as biografias dos artistas conhecidos, veremos que
foram muito poucos os que mostraram talento artístico para a arte e alcançaram
um alto nível de destreza sem ajuda de ninguém. O pai de Picasso era professor
de desenho e o de Mozart, de música.
Aprofundando
um pouco mais, acredito que, se nós educadores permitirmos aos alunos
escolherem o que vão estudar via mundo digital, estaremos dando carta branca
para que aprendam muito menos. Estaremos produzindo jovens que se divertem bastante
no processo educativo, mas que se comunicam pobremente, tornando-se pouco
reflexivos, dispersos e consumistas. Dificilmente formarão aquela base necessária
para desenvolvimentos intelectuais posteriores, como comprovamos hoje
tristemente na vida universitária.
A
escola sempre foi o momento privilegiado para que o jovem tivesse um contato
mais profundo com a literatura, a história, a geografia, a filosofia. Mas, em
relação ao tempo e espaço necessários para a reflexão e interiorização dos
valores que nos vêm dessas ciências humanas, o computador por vezes mais
atrapalha do que facilita, pois tudo isso exige o esforço de uma leitura
meditada, pausada e debatida, o exato contrário do que um mero clique de mouse
proporciona.
Podemos
concluir que enxergar no computador a panaceia educacional é um grande perigo.
Que a moda da tecnologia de informação na sala de aula e em casa somente será
útil quando tanto os professores quanto os alunos tiverem bons conhecimentos
prévios das respectivas matérias, fruto de muita leitura, do estudo pausado e do
conteúdo devidamente retido. Quando aprenderem a relacionar as diversas
disciplinas e a pensar logicamente. Caso contrário, a nova pedagogia informática
poderá estar favorecendo – contrariando as expectativas –, apenas uma nova elite intelectual que, como
sempre acontece, englobará uns poucos
que, por um motivo ou outro, conseguem aprender de verdade por conta própria. Mas
a grande maioria continuará sendo manipulada por uns poucos, fruto de um
abandono “ingênuo” de alguns professores.
[1] http://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/conteudo.phtml?tl=1&id=1101010&tit=Os-perigos-dos-computadores-no-processo-educacional
[1] http://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/conteudo.phtml?tl=1&id=1101010&tit=Os-perigos-dos-computadores-no-processo-educacional