Este artigo foi publicado na revista SER FAMÍLIA, em julho de 2012 (N. 32)
Quando
entramos hoje em qualquer livraria renomada, é comum que a prateleira dos
livros de autoajuda seja uma das mais frequentadas. A cada ano que passa,
livros desta categoria são buscados com avidez maior, e é bem possível que os
leitores das outras prateleiras já tenham se perguntado alguma vez: qual será a
causa do sucesso deste “movimento literário” de segunda categoria?
Os
motivos podem ser muitos, mas uma coisa é certa: estes consumidores não estão
bem. Multiplica-se o sentimento de baixa autoestima. Paira no ar uma sensação
de frustração existencial e de engano. As pessoas parecem estar buscando
soluções para problemas que não sabem definir ao certo, tampouco sua origem.
Mas acredito poder ao menos intuir que, em todas elas, a afetividade está sofrendo,
o orgulho se encontra doente e a alma desgovernada. Por isso parece oportuno
refletir sobre como encaminhar melhor a educação afetiva não só nas famílias,
mas também no ambiente escolar para poder sonhar com uma sociedade mais feliz.
Conscientizemo-nos de que os
problemas humanos, psíquicos e espirituais são sempre resultado de um processo
longo que se origina quase sempre na infância ou adolescência. Sou da opinião de
que, para aperfeiçoar e desenvolver mais adequadamente as diversas forças
afetivas – sentimentos, emoções e paixões –, precisamos entender melhor a
diferença entre a boa autoestima e a verdadeira humildade. É preciso compreender
que a busca de uma melhora puramente afetiva é pobre e insuficiente para o ser
humano, que também é racional e relacional e, portanto, ético.
A boa autoestima é apenas um
sentimento. Nasce do âmbito da psicologia. É um sentimento positivo sobre si
mesmo. Já a humildade é uma virtude moral. É muito mais que um estado de ânimo:
é fruto do conhecimento e da aceitação interior das qualidades e defeitos de
cada um. É a velha sabedoria da pessoa que sabe aceitar-se tal como é, porque foi
ensinada a conhecer-se desde pequena com as suas virtudes, tendências, vícios e
inclinações. E aprendeu que a perfeição humana só virá depois de muitos anos de
luta e de ajuda dos outros.
Infelizmente,
seja por pura ignorância, seja por um sentimentalismo disfarçado, alguns
educadores exibem atualmente um medo excessivo de mostrar a verdade no mau
comportamento de seus pupilos. Devido a uma mistura de sentimentos de culpa com
receios de contristar na correção, preferem convencer os educandos de que não
têm defeitos, de que o importante é serem espontâneos e fazer o que gostam.
Tentam inculcar-lhes uma falsa autoestima, inclusive à custa da verdade sobre si
mesmos. É lógico que o bom educador deve preferir educar no positivo, prevenir
e combater complexos de inferioridade, mas nunca em detrimento da realidade,
fazendo crer aos jovens que são melhores do que são. A verdade sempre se impõe,
mais cedo ou mais tarde, e o engano inevitavelmente provoca uma frustração
maior.
Parece,
portanto, que o mais saudável e eficiente é educar tanto na humildade quanto na
autoestima. Ambas podem ajudar o jovem a enfrentar-se e a enfrentar os desafios
da vida. Uma pessoa pode ter sentimentos de autoestima elevada por ter boa
aparência, apresentar bons resultados acadêmicos ou esportivos, possuir dons
artísticos invejáveis etc. Neste caso, o aprendizado da virtude da humildade – ensinando
que esses diferenciais são dons “emprestados” que devem ser utilizados para o
serviço aos outros, por exemplo — contribuirá para “baixar a crista” do
privilegiado. Por outro lado, há pessoas que exibem atitudes erradas de
humildade, como um exagerado desprezo por si mesmo, seja porque não é muito
sociável, por ter claras limitações intelectuais, encontrar-se em uma situação
financeira difícil etc. Nessa situação, um apoio e incentivo no sentimento da boa
autoestima, através de elogios aos trabalhos escolares ou de pequenas iniciativas
positivas no ambiente familiar, por exemplo, poderá estimular essas pessoas a
esquecer-se de si mesmas e a não ficar preocupadas com sua imagem perante os
demais. Portanto, humildade e autoestima, apesar de estar em âmbitos
diferentes, podem ajudar-se mutuamente a buscar o equilíbrio interior: a
autêntica humildade será sempre o melhor antídoto contra o complexo de
inferioridade que brota de uma afetividade tendendo para o pessimismo e a apatia.
E o estímulo de uma razoável autoestima pode produzir arranques de motivação. A
humildade recorda que o sentimento de autoestima deve estar unido à verdade. E
a boa autoestima pode elevar uma visão negativa da vida e das coisas que, em
geral, causa uma humildade exagerada. Encontrar este equilíbrio entre o mundo
afetivo e o mundo racional-volitivo é uma das missões da educação ética. O
aprendizado das virtudes morais é o caminho para alcançar esse equilíbrio
motivacional.
Infelizmente,
diante da cultura atual — na qual parecem prevalecer a mentira, o "parecer
ser" ou simplesmente ter, e ter mais que os outros — o ideal educacional
de formar na busca da perfeição do ser humano acaba por desfigurar-se. Os
colégios, pressionados por essa dinâmica e por outras pressões sociais pouco
dignas da natureza humana, acabam oferecendo apenas aquilo que seus “clientes” —
entenda-se pais – privilegiam, resultando depois no desprezo pela verdadeira
educação de excelência. Essa nova pedagogia tornou-se, na prática, uma
antieducação, pois deixa lacunas profundas no educando, que mais tarde as
sentirá. Hoje se educam as pessoas para ser, mais do que competentes,
competitivas. São incentivadas para viver a “lei da selva”: pode mais, não aquele
que tem mais qualidades, mas sim o que grita mais, quem tem mais bens materiais
ou é mais intrépido. Uns acentuarão sua arrogância e se autoafirmarão
humilhando os demais com os seus diversos meios de poder. São os casos
frequentemente noticiados do bullying
e da indisciplina perante os professores. Outros serão vítimas de uma timidez
crescente que criará depois um mecanismo de autodefesa, buscando a autoestima, de
forma pouco reta, através do êxito escolar ou esportivo, motivados pela
vaidade. E um terceiro e mais numeroso grupo, que fica entre esses dois,
tentando sobreviver com ideais medíocres na lei do mais forte, porque na
prática lhes falta a capacidade de buscar os ideais mais altos uma vez que são
fracos. Não parece, portanto, que os colégios estejam cumprindo a sua missão de
educar integralmente o ser humano.
Qualquer
educador que vê este processo de desordem moral crescendo nas últimas décadas,
naturalmente fica assustado e perplexo. Consegue intuir que muitas desordens
sociais presentes nos adultos – corrupções, infidelidades, depressões, desvios
afetivos, libertinagens, doenças mentais – têm suas origens nessas sementes venenosas
a que nos referimos acima, plantadas no período escolar e regadas pela cultura
de uma fragmentação ética. É possível agora entender a questão introdutória do
porquê de as pessoas precisarem ser ajudadas nas livrarias e nos consultórios
psiquiátricos. O que fazer?
É
preciso revelar ao jovem desde cedo que dentro de si “vive” um déspota que o
escraviza. Ele — o déspota — exige desde pequeno de forma desmedida a satisfação das necessidades humanas, gerando um enorme
amor por si mesmo e um desprezo pelos demais. Este déspota só se enfraquecerá
quando deixarmos de alimentá-lo com o exagerado consumo ou posse de bens
materiais ou ainda de estimulá-lo com vaidades efêmeras e ilusórias.
Enfraquecendo esse falso poder do déspota, será possível passarmos a alimentar
de forma mais justa o amor aos outros. É preciso desmascarar as falsas regalias
de uma vida “independente”, de uma vida sem compromisso, dos sonhos de uma vida
solitária e de uma vida abastada, que lhe exige o “déspota” e a cultura
materialista e tirânica do momento. Somente quando tivermos em nossa vida
pessoas a quem amamos mais do que ao “déspota”, será possível libertarmo-nos desta
escravidão. Como é fácil verificar esta dinâmica do amor nas famílias numerosas
ou numa comunidade na qual reina o serviço generoso e abnegado!
Outras
formas de enfraquecer o “déspota” é ensinar aos jovens desde cedo os valores da
sinceridade, da generosidade com os próprios bens materiais, da pontualidade no
relacionamento com os demais, no cumprimento exigente dos próprios deveres
familiares e escolares e no exercício constante do perdão. Agindo assim, será sem
dúvida possível vislumbrar uma sociedade vivendo realmente uma humilde autoestima.