Num recente
Congresso Regional de Educação, após expor o tema “O papel das virtudes éticas
na motivação escolar da criança”, recebi uma pergunta, em tom meio desafiador,
de uma professora já em fim de carreira, sem dúvida bem intencionada: “Quer
dizer então que você quer voltar a ’vestir‘ nossas crianças com uma ’camisa de
força‘ ensinando-lhes a prática das virtudes?” Com muito respeito e
compreensão, respondi com serenidade à provocação, enquanto pensava para
comigo: “Aqui está a expressão do medo atual dos pais, professores e educadores
em geral de ensinar as virtudes morais na família e na escola”.
Efetivamente, no imaginário
coletivo de muitos responsáveis pela educação, o conceito de virtude está
associado a traumas, repressão, perda da liberdade e da autenticidade,
tristeza, formatação e muitos outros sentimentos que a mistura da psicologia com
filosofias modernistas se encarregaram de introduzir em nossa cultura. Por
outro lado, nós, educadores atuantes, percebemos hoje em sala de aula a partir da
perspectiva histórica que os anos dão, que ter deixado nossas crianças vestir a
“camisa de força das próprias paixões irracionais”, que é o que acontece na
prática quando não se educa nas virtudes, foi muito pior e “escravizante”. Os
alunos estão em geral completamente desmotivados, falta-lhes muitas vezes
capacidade de vislumbrarem ideais mais valiosos; sofrem de desamor e solidão de
forma precoce e por isso desrespeitam os demais; estão imaturos para a idade; a
preguiça e inconstância nos objetivos os enfraquecem; não sabem o que fazer com
a afetividade desgovernada e, ao sentirem medo da vida e da realidade, se
refugiam em diversas “bolhas” cada vez mais densas e mais nocivas para a sua
felicidade.
A primeira é a seguinte: quem
não foi educado nos bons hábitos de
escolha (conceito de virtude) só terá uma liberdade aparente. Nossos vícios
de preguiça, vaidade, egoísmo nos impedem de ver as coisas como realmente são e
fazem com que certos aspectos nos pareçam tão atrativos que prevaleçam sobre
outros de maior valor objetivo. Nossa sensação é de que atuamos com liberdade,
porque conservamos o controle de nossos atos, quando na realidade essa escolha
procede de um defeito da liberdade, da incapacidade de ver as coisas em seu
valor verdadeiro. Para ser autenticamente livre, o querer da nossa vontade deve
proceder de um juízo correto sobre a realidade e se esforçar para que não seja desfigurado
pelas próprias paixões.
Portanto, a liberdade pressupõe a formação. Para que as escolhas sejam boas, é
necessário um critério bem formado e interiorizado. Não basta escolher de forma
automática, sem reflexão e de modo involuntário. E é importante recordar a
todos os educadores que ninguém pode nem deve intervir nas escolhas de seus pupilos,
principalmente quando vão ficando mais velhos. São suas próprias decisões que
os formam realmente. E não as escolhas dos outros, por mais que sejam boas – a não ser que os jovens, por um ato
livre, as assumam depois. Naturalmente, são importantíssimas as presenças do
pai e do professor para informar,
iluminar, sugerir, fazer pensar. Mas formar realmente só será possível quando o
educando repetir inúmeras vezes na prática o que se aconselha, depois de ter
captado racionalmente que vale a pena.
Portanto, o verdadeiro aprendizado das virtudes está muito longe da imposição
ou da coação. Está próximo de incentivar o próprio esforço, a renúncia ao
gosto, o vencer-se nas más inclinações, mas com uma sensação gostosa e mais
profunda de verdadeira liberdade...
E quais as virtudes que devem
ser ensinadas prioritariamente? Segundo alguns educadores, até os 7 anos de
idade, a virtude da temperança deve ocupar um espaço privilegiado. É a virtude
que aperfeiçoa e regula a tendência para o prazer desmedido. Limites na comida,
conforto, diversão, na desordem material e temporal, entre outros, são alguns
campos de luta. Depois dos 7 anos, outra virtude deverá ser incentivada: a fortaleza.
É incentivar a capacidade de esforço e de sacrifício, principalmente, tendo em
vista ideais que nos superam. A título de exemplo, tudo o que seja incentivar o
estudo mais ordenado (horário de estudo, estudar primeiro o que não agrada,
etc), pequenos serviços na própria família, a busca por novas amizades,
investimentos culturais mais exigentes, entre outros, são práticas
comprovadamente salutares.
Concluamos: por que existe o medo
de educar nas virtudes? Primeiro: porque muitos educadores nunca conheceram a
dinâmica interna da formação da liberdade do homem. Segundo: porque educar os jovens
nas virtudes que direcionam a afetividade para os outros (a temperança e a
fortaleza) exige muita paciência dos educadores, além do próprio exemplo, que
nem sempre é ”exemplar”. Por fim, porque a ilusão de viver uma vida cheia de
“instantes de prazer” parece à primeira vista mais feliz do que a “vida
prazerosa” da virtude. Deixo ao leitor refletir e decidir qual vida vale realmente mais a pena.